A doutrina sobre o Purgatório não está bem explícita na Bíblia Sagrada, daí porque a dificuldade dos protestantes, inclusive porque não contam com a Tradição Apostólica nem com o Magistério da Igreja. No entanto, já se constituía em crença desde o Antigo Testamento e podemos encontrar algumas passagens que dão as idéias fundamentais de sua existência[1].
Ensina o Catecismo da Igreja Católica:
§1030 Os que morrem na graça e na amizade de Deus, mas não estão completamente purificados, embora tenham garantida sua salvação eterna, passam, após sua morte, por uma purificação, a fim de obter a santidade necessária para entrar na alegria do Céu.
§1031 A Igreja denomina Purgatório esta purificação final dos eleitos, que é completamente distinta do castigo dos condenados. A Igreja formulou a doutrina da fé relativa ao Purgatório sobretudo no Concílio de Florença e de Trento. Fazendo referência a certos textos da Escritura, a tradição da Igreja fala de um fogo purificador:
No que concerne a certas faltas leves, deve-se crer que existe antes do juízo um fogo purificador, segundo o que afirma aquele que é a Verdade, dizendo, que, se alguém tiver pronunciado uma blasfêmia contra o Espírito Santo, não lhe será perdoada nem presente século nem no século futuro (Mt 12,32). Desta afirmação podemos deduzir que certas faltas podem ser perdoadas no século presente, ao passo que outras, no século futuro.
§1032 Este ensinamento apóia-se também na prática da oração pelos defuntos, da qual já a Sagrada Escritura fala: "Eis por que ele [Judas Macabeu) mandou oferecer esse sacrifício expiatório pelos que haviam morrido, a fim de que fossem absolvidos de seu pecado" (2Mc 12,46). Desde os primeiros tempos a Igreja honrou a memória dos defuntos e ofereceu sufrágios em seu favor, em especial o sacrifício eucarístico, a fim de que, purificados, eles possam chegar à visão beatífica de Deus. A Igreja recomenda também as esmolas, as indulgências e as obras de penitência em favor dos defuntos:
"Levemo-lhes socorro e celebremos sua memória. Se os filhos de Jó foram purificados pelo sacrifício de seu pai, que deveríamos duvidar de que nossas oferendas em favor dos mortos lhes levem alguma consolação? Não hesitemos em socorrer os que partiram e em oferecer nossas orações por eles. § 1472 AS PENAS DO PECADO Para compreender esta doutrina e esta prática da Igreja, é preciso admitir que o pecado tem uma dupla conseqüência. O pecado grave priva-nos da comunhão com Deus e, conseqüentemente, nos toma incapazes da vida eterna; esta privação se chama "pena eterna" do pecado. Por outro lado, todo pecado, mesmo venial, acarreta um apego prejudicial às criaturas que exige purificação, quer aqui na terra, quer depois da morte, no estado chamado "purgatório". Esta purificação liberta da chamada "pena temporal" do pecado. Essas duas penas não devem ser concebidas como uma espécie de vingança infligida por Deus do exterior, mas, antes, como uma conseqüência da própria natureza do pecado. Uma conversão que procede de uma ardente caridade pode chegar à total purificação do pecador, de tal modo que não haja mais nenhuma pena”.
Ainda:[2]:
“O Purgatório, segundo a Igreja Católica, não é um nível intermédio entre o Inferno e o Paraíso, mas um local de purificação onde ficam as almas que morreram em estado de graça (isto é, já estão destinadas ao paraíso), mas ainda precisariam se preparar para ter capacidade de ver Deus face-à-face no Céu. A sua existência foi teorizada no pontificado do Papa Gregório I, em 593, com base no livro de 2Mc 12, 42-46 (que foi considerado apócrifo pelos líderes da Reforma Protestante, cinco séculos depois). O Concílio de Florença, realizado em 1439, aprovou a doutrina, que foi confirmada depois no Concílio de Trento, em 1563”.
Os cristãos da Igreja Católica sabem que existem o Céu, Inferno e Purgatório. Sabem que o Céu é destinado aos justos, pessoas que morrem em pleno estado de graça. Sabem que o Inferno é destinado aos que rejeitam Deus ao ponto de morrer conscientemente negando Deus e os seus ensinamentos: “E estes irão para o castigo eterno, e os justos, para a vida eterna” Mt 25,46.
Céu e Inferno são aceitos por todos os cristãos. Já o Purgatório, não.
Sabemos que no céu ninguém entra se não se encontrar em completo estado de graça, sem nenhuma mancha ou inclinação ao pecado. É o que ensina o Ap. 21,27 ao fazer alusão ao Céu: “nada de impuro pode entrar”.
Sabemos, também, que o pecado provoca uma grande debilidade espiritual que nem sempre o arrependimento supera. Manchas sempre ficam e que precisam ser eliminadas em vida neste mundo, ou depois da morte.
Se existisse somente o Céu e o Inferno, onde a alma retiraria essa mancha? No Céu? Não, porque lá não pode entrar. No inferno? Também não porque o inferno é um estado de alma final, irreversível, sem nenhuma chance de sair da lá para aqueles que não serviram o Senhor cf. parábola em Mt 25, 26-43. Resta, assim, o purgatório, não como invenção, nem como uma terceira alternativa, (pois que como merecimento continua existindo apenas o Céu e o Inferno), mas como uma realidade teológica e bíblica confirmada pela autoridade do Magistério da Igreja Católica.
O purgatório, portanto, não é uma possibilidade a mais para se chegar ao Céu, mas uma passagem para a purificação dos resquícios do pecado, aquelas manchas que apesar de perdoadas e em estado de graça, ainda permanecem em algumas pessoas, como a própria inclinação ao pecado, porque as almas do purgatório, todas elas, irão seguramente para o Céu.
Para os fundamentalistas, dizer que somente vale o que está escrito na Bíblia é errado, pois segundo João ao encerrar o no 21,25 afirma que “Jesus fez ainda muitas outras coisas. Se fossem escritas uma por uma, penso que nem o mundo inteiro poderia conter os livros que se deveriam escrever”.
Cabe, sem dúvida, à Igreja Católica Apostólica Romana, e somente a ela, pelo Papa, interpretar a Sagrada Escritura e falar em nome de Deus por autoridade concedida por Jesus Cristo para a orientação dos fiéis. Não ao homem comum porque pode errar (Mt 22,29). Vide § 85 do Catecismo da Igreja Católica. Afinal, se a tese protestante é a do livre exame, respeitem eles o livre exame da Bíblia pela Igreja Católica principalmente ante a autoridade que o Papa recebeu de Jesus e a proteção do Espírito Santo.
Evidências bíblicas:
“É por isso que eu digo a vocês: todo pecado e blasfêmia será perdoado aos homens; mas a blasfêmia contra o Espírito não será perdoada. Quem disser alguma coisa contra o Filho do Homem, será perdoado. Mas quem disser algo contra o Espírito Santo, nunca será perdoado, nem neste mundo, nem no mundo que há de vir.» Mt 12,31-32.
“Aquele, porém, cuja obra for queimada perderá a recompensa. Ele mesmo, entretanto, será salvo, mas como que através do fogo”. 1Cor 3,15
“Se alguém fez alguma acusação contra você, procure logo entrar em acordo com ele, enquanto estão a caminho do tribunal; senão o acusador entregará você ao juiz, o juiz o entregará ao guarda, e você irá para a prisão. Eu garanto: daí você não sairá, enquanto não pagar até o último centavo.» (Mt 25-26).
"Ora , quando fores com o teu adversário ao magistrado, faze o possível para entrar em acordo com ele pelo caminho, a fim de que ele não te arraste ao juiz, e o juiz te entregue ao executor, e o executor te ponha na prisão. Digo-te: não sairás dali, até pagares o último centavo."( Lc, 12, 58-59).
Um texto bíblico muito forte vem do Antigo Testamento, no livro dos Macabeus, não existente na Bíblia dos Protestantes, motivo pelo qual transcrevo os versículos completos:
"39. No dia seguinte, como a tarefa era urgente, os homens de Judas foram recolher os corpos daqueles que tinham morrido na batalha, a fim de sepultá-los ao lado dos parentes, nos túmulos de seus antepassados. 40 Foi então que encontraram, por baixo das roupas de cada um dos mortos, objetos consagrados aos ídolos de Jâmnia, coisa que a Lei proibia aos judeus. Então ficou claro para todos o motivo da morte deles. 41 E todos louvaram a maneira de agir do Senhor, 42 Puseram-se em oração, suplicando que o pecado cometido fosse totalmente cancelado. O nobre Judas pediu ao povo para ficar longe do pecado, pois acabava de ver, com seus próprios olhos, o que tinha acontecido por causa do pecado daqueles que tinham morrido na batalha. 43 Então fizeram uma coleta individual, reuniram duas mil moedas de prata e mandaram a Jerusalém, a fim de que fosse oferecido um sacrifício pelo pecado. Ele agiu com grande retidão e nobreza, pensando na ressurreição. 44 Se não tivesse esperança na ressurreição dos que tinham morrido na batalha, seria coisa inútil e tola rezar pelos mortos. 45 Mas, considerando que existe uma bela recompensa guardada para aqueles que são fiéis até à morte, então esse é um pensamento santo e piedoso. Por isso, mandou oferecer um sacrifício pelo pecado dos que tinham morrido, para que fossem libertados do pecado”. 2Mac 39-45
Existe, portanto, a possibilidade de uma forma de reparação após a morte.
Exemplo clássico é o do prego na parede: o prego simbolizando o pecado. Quando você o retira, sai o prego, mas permanece o pequeno buraco por ele causado. Esse pequeno buraco, na comparação, é a mancha ou inclinação ao pecado que ficou e precisa ainda ser tratado para não deixar marca na parede, embora o prego (o pecado) não exista mais.
Em termos de purgatório, é essa mancha ou inclinação que é retirada pela purificação.
Todo o pecado têm duas penas: 1ª a pena eterna ou inferno. 2ª a pena temporal.
Com a confissão dos pecados a pena eterna fica perdoada, mas não a pena temporal, conseqüência, como a do pequeno buraco do prego, que permanece no penitente. Daí porque a penitência que o sacerdote aplica após a confissão.
Essa pena temporal será diminuída ou extinguida em vida pelos diversos atos de misericórdia, ou depois da morte, no purgatório, pelas orações, intercessões ou indulgências.
Temos plena consciência de que, mesmo que o homem arrependa-se do pecado e faça a sua confissão, seja a sacramental ou “diretamente” a Deus, a fraqueza humana faz com que, mesmo assim, o penitente, ainda que absolvido dos pecados, mantenha no seu íntimo inclinação ou tendência a voltar a pecar. Não fosse isso, o cristão não voltaria a pecar, nem necessitaria de uma nova confissão.
Como se vê, não alcançamos, ainda, santidade suficiente para, uma vez arrependidos, não pecar mais. Nem os católicos, nem os protestantes. Daí porque as repetidas confissões.
Enquanto o homem não se libertar, também dessa mancha ou inclinação, não estará na plenitude da graça e não poderá entrar no Céu, embora merecedor. É inimaginável a presença da alma no Reino dos Céus ainda pensando ou inclinado ao pecado. Daí porque a necessidade da compreensível doutrina do purgatório.
Certamente que se o homem conseguir plenamente, ainda em vida, não apenas o arrependimento do pecado, mas também libertar-se completamente de qualquer resquício ou tendência a essa fraqueza pecaminosa, e chegar a morrer nessa condição, não necessitará passar pelo purgatório e terá a gloria do céu imediatamente.
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